Objetivos e intenções do Onda Negra.

O Onda Negra surge como um desejo de exteriorização de algumas reflexões que estão diretamente ligadas à questão racial. Almejamos com este espaço a problematização e discussão sobre temas como o racismo, o preconceito racial e a discriminação. Possivelmente, veremos também discussões sobre processos que apontam para uma predominância da desigualdade social e racial no nosso país.

Em alguns momentos, apresentaremos sugestões, análises e reflexões de filmes que abordam diretamente ou indiretamente a temática racial, ou, que dialoguem com a mesma. Salientamos que dentro desta proposta não deixaremos de abordar, por exemplo: a questão de gênero, os processos do mundo do trabalho e a questão racial, a questão da violência racial e, principalmente, alguns processos que envolvam reparação e ganhos para a população negra, como no caso das políticas de Ações Afirmativas.

Por último, explicamos que a origem do nome Onda Negra foi pensado a partir do livro da Celia de Azevedo, "Onda negra, medo branco". Nesse livro, a autora estabelece um intenso debate em torno das "questões senhoriais travadas por abolicionistas e imigrantistas ao longo do século dezenove. Decerto esse debate ainda se arrastaria pelo tempo não fosse a intervenção dos próprios escravos com suas ações autônomas e violentas, aguçando os medos da 'onda negra', imagem vívida forjada no calor da luta por elites racistas."

Sendo assim, julguei pertinente fazer uma alusão a esta "onda negra" que se tratava do medo das elites com os retrospectos das lutas anti-escravistas (ou por libertação dos negros escravizados) como por exemplo, a Revolução Haitiana; para tratar dos problemas contemporâneos que envolvem a condição do negro em nossa sociedade. Enquanto as lutas ganham força por ganhos de direitos, por igualdade de condições no mercado de trabalho em relação aos brancos, por políticas de reparação e de inclusão com as Ações Afirmativas, percebe-se que todo esse movimento ainda desperta em alguns grupos da nossa sociedade um incômodo, uma desconfiança e a meu ver um medo.

quinta-feira, 23 de janeiro de 2014

Uma lição de discriminação – “Eles têm mais tendência a roubar, a ser maus e violentos.”



Compartilho hoje com vocês um documentário muito importante para nós professores e professoras, pais e mães, alunos e alunas e estudantes de modo geral. O nome do documentário é “Uma lição de discriminação”.

Uma menina me chamou à atenção ao descrever como foi passada para ela a idealização dos negros.  “Eles têm mais tendência a roubar, a ser maus e violentos.”





Segue a descrição postada no youtube:

Desde o começo dos tempos, os seres humanos têm tendência a formar grupos, excluindo assim estranhos, inimigos, e qualquer um que seja diferente. Podemos não exatamente incentivá-las, mas tais atitudes tornam-se arraigadas a partir de uma idade muito precoce.
Este documentário acompanha uma experiência em uma escola primária que mostra o quão rapidamente as crianças podem assimilar a discriminação e todas as suas repercussões. Uma professora do ensino primário em Quebec conduziu um experimento no qual ela afirmou que estudos científicos provam que as crianças menores são geralmente mais criativas e inteligentes, e as mais altas são desajeitadas e preguiçosas. Ela dividiu sua turma com base nessas suposições. No dia seguinte, ela virou o jogo e fez com que se invertessem os papéis.
Algumas crianças de nove anos de idade entenderam que era tudo um jogo, mas para o resto acabou por ser uma experiência muito poderosa.
Produção: Radio-Canada 2006.


Postado essa descrição do documentário, sinto que podemos falar muito mais dele. Ele realmente nos dá muitas possibilidades para discutirmos sobre como se constrói, se sente e afeta o “outro” que é diferente. O diferente do que é colocado como “padrão” ou normal em muitas sociedades, inclusive a nossa. No caso do experimento realizado pela professora com as autorizações necessárias por parte dos pais e da escola, se resume em fazer as crianças sentirem os efeitos da discriminação para que aprendam como se sente ou sofre uma pessoa ou criança discriminada. Dito isso, faço uma ressalva sobre o fato de na sala de aula não existir nenhuma criança negra. Ah! Nem a professora é negra.


Como vocês viram no vídeo, as crianças depois de divididas, especificamente, as crianças mais altas, que eram vistas como inferiores quando comparados com as crianças baixas, tiveram expostas suas características físicas, psíquicas e até comportamentais expostas, referenciadas como algo ruim. Logo, por serem altas, começaram a se sentir excluídas e inferiorizadas. Numa das passagens do documentário uma das crianças diz que ficou sem concentração, pois, sabia que o fato de ir ao quadro resolver um exercício, solicitado pela professora, desencadearia a zombaria dos seus colegas. Resultado, ele não conseguiu fazer a atividade como se deveria. E, se sentiu muito mal.


O que quero chamar à atenção, para que nós reflitamos com o que assistimos no documentário, é que a sala não tinha nenhuma criança negra, caso queiramos enfatizar a diferença como algo em questão. Mas, mesmo assim, com crianças brancas tendo destacadas características que as inferiorizavam, o resultado (e as dores que sentiram) foi surpreendente. Elas sentiram o que muitas crianças negras sentem todos os dias na sala de aula, na rua, nas relações com alguns pais de coleguinhas quando evitam convidá-lo para ir à casa dos seus filhinhos brancos. Elas sentiram que a discriminação não nos faz bem. Ou seja, o experimento da professora nos mostrou que a discriminação causa danos que se não nos atentarmos para eles logo nos primeiros anos de vida dessas crianças, na escola e em casa, teremos uma reprodução ou uma retroalimentação de cidadãos racistas e preconceituosos.


Na sociedade que vivemos podemos ter bastante exemplos do que quero dizer. Basta lembrarmos o caso do jovem que ao ter um resultado negativo no vestibular, julgou como fonte da sua reprovação as cotas raciais. Com esta insatisfação, o seu racismo, “talvez” adormecido, aflorou. Ele postou no site do mercado livre a venda de negros pela quantia de R$ 1,00. Essa sua atitude nos diz muito.


Mas voltemos à discussão do documentário, será que vocês, quando terminarem de ver o vídeo, conseguem imaginar os males que a discriminação causa nas vidas das crianças negras na sala de aula?


Por exemplo: Que menina linda! Olha como esse cabelo tão loirinho a deixa parecida com uma princesa. Linda! Olha estes olhos azuis. Minha nossa... Aí, atrás desta criança tem uma menina negra que em nada se parece com a menina branca com “cara” de princesa (pensamento de princesa no sentido e modelo eurocêntrico branco). O que se deve fazer numa hora dessas? São em momentos como estes que a discriminação se instala e causa seus danos. Pensemos nisso!


Sei que muitos não têm a intenção de gerar ou incitar a discriminação, mas ela está no nosso cotidiano e nas mínimas expressões que utilizamos. Sejam elas na relação familiar ou nos exemplos dentro da escola. Temos que combater sempre. Sei que os avanços advindos da implantação da lei 10.639/03 ainda não são suficientes. Queremos mais. Pois sabemos que entre a lei e a sua implementação, na prática docente, existe uma distância que ainda persiste em se fazer presente.



Por fim, ao ver o choro daquelas crianças tão críticas e indignadas com a discriminação e seus males, pensei nos milhares, ou até, nos milhões de crianças negras que estão sendo violentadas todos os dias em nossas escolas e, infelizmente, não podemos acabar ou extinguir essa realidade de uma vez por todas. Finalizo, emanando o desejo e a energia para que as reflexões que surgirão com este documentário possibilitem novas ações transformadoras em nossas salas de aula.